(CORONAVÍRUS / COVID-19) CRISE ECONÔMICA E O CORONAVÍRUS - O INADIMPLEMENTO E A POSSIBILIDADE DE RESCISÃO CONTRATUAL DIANTE DA PANDEMIA DO COVID-19
16/03/2020

“Uma análise da teoria da imprevisão (cláusula rebus sic stantibus) para a resolução dos contratos, e do inadimplemento frente ao caso de força maior, no caso concreto da pandemia do COVID-19.”

 

Pedro Cascaes Neto¹

 

Muito se tem falado sobre o COVID-19 (SARS-COV-2), espécie de coronavírus, nas redes sociais, telejornais e mesmo nos círculos de conversas  e desde a declaração da OMS (Organização Mundial da Saúde), em 11 de março de 2020, de que se trata de uma pandemia e, portanto, “emergência de saúde pública de âmbito internacional (PHEIC)”, há um temor generalizado acerca do tema. Não sem razão, dada a alta letalidade e velocidade de disseminação da doença que se iniciou pelos países epicentro (China, Itália, Coréia do Sul, etc).

 

Em consequência desta situação inesperada e imprevisível, as autoridades públicas em mobilização como poucas vezes vista na história, estão editando decretos, portarias e resoluções, em todos os poderes constituídos (executivo, legislativo e judiciário), nas três esferas federadas (municípios, Estados e União), nas entidades da sociedade civil (conselhos profissionais, OAB, sindicatos, federações, associações) e mesmo dentro das empresas, cancelando-se eventos, proibindo-se aglomerações e reuniões, instituindo-se teletrabalho (home-office), dentre outras tantas medidas para evitar o contágio e baixar a curva de disseminação do vírus.

 

Tal situação emergencial implica em impactos incomensuráveis na economia, como pode ser observado pela queda brutal nos índices das bolsas de valores de todo o planeta, na disparada do dólar frente ao real, na redução drástica de venda de passagens áreas, de ônibus, reservas em hotéis, esvaziamento de restaurantes, queda de circulação em shoppings center, em atividades de lazer, cancelamentos de feiras e eventos, dentre outros.

 

Não fosse suficiente, ainda há o iminente desabastecimento de indústrias, e em consequência do próprio comércio, considerando que o Brasil é um grande importador de matéria prima e produtos manufaturados da China, principal país atingido pelo coronavirus.

 

Todo esse cenário aterrador para a economia implicará, como já vem implicando, na rescisão de contratos e no inadimplemento de obrigações.

 

As questões que merecem a análise neste momento são: 

 

a) É possível a rescisão de contratos, sem a necessidade de pagamento de encargos rescisórios, em razão da crise causada pelo COVID-19?

 

b) A inadimplência de obrigações, como parcelas de contratos, empréstimos bancários, podem sofrer efeitos moratórios (juros, multas, vencimento antecipado, etc.), em razão da crise causada pelo COVID-19?

 

Para a resposta destas duas indagações, pretende-se, em relação à questão ‘a’, pela aplicação da teoria da imprevisão, invocando-se a cláusula rebus sic stantibus, prevista nos artigos 478, 479 e 480, todos do Código Civil² e, portanto, possibilitando-se a rescisão contratual por justa causa, sem ônus rescisórios.

 

Quanto à questão ‘b’, entende-se pela aplicação da tese do caso de força maior, prevista no artigo 393, do Código Civil³, que isenta de responsabilidade o devedor pelo inadimplemento em situações irresistíveis, imprevistas e descontroladas, impedindo os consequentes efeitos moratórios (juros, multas, vencimento antecipado etc.).

 

É necessário, antes de mais nada, esclarecer que cada caso detém suas particularidades que precisam ser analisadas individualmente. Outrossim, somente poderá fazer jus aos benefícios legais antes destacados, quem puder provar ter sido atingido diretamente pela crise criada pela pandemia de COVID-19.

 

Portanto, não é crível esta alegação às dívidas anteriores a março/2020.

 

Afora disso, é possível, independentemente da existência da atual pandemia, e neste ponto extensível a todos os contratos e débitos passados, atuais, e mesmo obrigações ainda não vencidas, a negociação coletiva com credores extrajudicialmente, através da chamada Recuperação Extrajudicial, ou ainda a própria Recuperação Judicial (substituta da antiga concordata). Ambos os institutos previstos para a superação da crise econômica empresarial (recuperação extrajudicial e recuperação judicial), estão previstos na Lei 11.101/05, e podem ser alternativas a superar às intempéries que o país está atravessando.

 

 

 

 

¹ Advogado Empresarialista, Professor, Árbitro e Administrador Judicial. Doutorando em Direito Civil pela Universidade Buenos Aires. Vice-Presidente da Caixa de Assistência dos Advogados de Santa Catarina. Membro da Comissão Especial de Direito Empresarial do Conselho Federal da OAB. 

 

² Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. 

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato. 

Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva. 

 

³Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. 

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. 

 

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