A DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA E O STF – SERÁ O FIM DA DESPEDIDA IMOTIVADA?
07/02/2023

Diversos portais de notícia têm divulgado que o Supremo Tribunal Federal (STF) pode acabar com a demissão sem justa causa. Primeiramente, cabe esclarecer que se trata de sensacionalismo jornalístico. Na verdade, o que ocorreu foi a recente retomada do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1625, que tramita no STF desde 1997.


 
A elevada importância do assunto se dá pelo envolvimento da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que foi aprovada pelo Congresso Nacional no ano de 1992 e ratificada pelo governo federal no ano de 1995. Deste modo, a ADI 1625 questiona um decreto assinado em dezembro de 1996 (decreto 2.100 de 20/12/96) – pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso – que suspendeu a adesão do Brasil à Convenção 158 da OIT.


 
Em outras palavras, diferente do exposto pela mídia, o STF não julgará se é ou não possível a despedida imotivada no ordenamento jurídico brasileiro. O que será julgado pela Suprema Corte brasileira é se houve validade no ato presidencial de cancelar unilateralmente – ou seja, independente da anuência do Congresso Nacional – a adesão do Brasil a uma convenção internacional.


 
A polêmica surgiu em razão do conteúdo da Convenção 158 da OIT. A aludida norma internacional dispõe em seu artigo 4º, in verbis: “"não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço." Já o artigo 7º da Convenção veda a dispensa de trabalhadores "por motivos relacionados com seu comportamento ou seu desempenho antes de se dar ao mesmo a possibilidade de se defender das acusações feitas contra ele."


 
Constata-se que a situação ganhou esta dimensão pelo fato de a Convenção 158 da OIT limitar o direito protestativo do empregador de rescindir o contrato de trabalho independente de motivação. Portanto, seguindo as determinações da norma internacional, é indispensável que o empregador comprove uma razão justificada para rescisão do contrato com base no comportamento do empregado, na sua capacidade de trabalho ou relacionada com a necessidade da empresa.


 
Grifa-se que quando a Convenção se refere a “causa justificada” para rescisão do contrato de trabalho, regulamenta a rescisão imotivada da relação laboral. Sendo certo, mesmo nos termos da norma internacional, que a rescisão motivada (por justa causa) possui regramento próprio.


 
Em síntese, o que a Convenção exige é que o empregado seja previamente informado do motivo ensejador da ruptura do seu vínculo empregatício de forma que lhe seja assegurado direito de defesa antes da rescisão.


 
De fato, o assunto é polêmico. Mas, salienta-se que o julgamento da ADI 1625 analisa um aspecto formal – validade da denúncia – cuja competência recai no STF em razão do envolvimento direto do tema com a Constituição Federal.


 
Então, a eventual declaração de inconstitucionalidade do supracitado decreto presidencial não importa em dizer que a Convenção 158 será automaticamente aplicada no ordenamento jurídico pátrio.  Neste contexto, há um entendimento, capitaneado pela Ministra Rosa Weber, no sentido de que é indispensável a aprovação do Congresso Nacional para validar o Decreto, mas fica mantida a eficácia das denúncias realizadas até a data do julgamento. Nesta hipótese, a denúncia presidencial da Convenção seria considerada válida.


 
É certo que, mesmo sendo declarado inconstitucional o decreto em comento, a aplicação da Convenção não seria imediata, visto que seria indispensável a atuação do Poder Legislativo no sentido de incorporar as normas da Convenção na legislação brasileira. Tanto é assim que o próprio artigo 1º da Convenção dispõe, in verbis: “dever-se-á dar efeito às disposições da presente Convenção através da legislação nacional."


 
Importante ressaltar, ainda, que a Constituição Federal brasileira em seu art. 7º, I, norma originária, também prevê, exatamente,  proteção do empregado face a dispensa injusta, desde que regulamento por lei complementar, até o presente momento não promulgada.


 
Assim, tendo em vista que a CF neste ano de 2023 completará 35 anos de vigência, é certo afirmar ser pouco provável que o Estado interfira no sensível tema de proibir a liberdade do empregador em despedir de forma imotivada nas rescisões sem justa causa.  Logo, é presumível que a decisão do STF deve se ater aos limites da discussão constitucional sem tratar especificamente sobre parâmetros para o término da relação de trabalho por Iniciativa do empregador.


 

Priscila Leiria
CASCAES, HIRT & LEIRIA ADVOCACIA EMPRESARIAL
OAB/SC 1.796



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